A favor da experiência, resolvi pintar minhas unhas de verde fosforescente. Coisas de mulher: salão, tinta, espera (e haja espera!). A cada mão de esmalte um pensamento diferente estagnava em minha mente. Lembranças vieram à tona.
Quando eu era adolescente testava meus limites por opção. Além das inúmeras roupas, que hoje eu chamaria de figurino, tinha o costume de usar esmaltes coloridos, alternando uma cor em cada unha.
Era uma boa época, em que eu descobria minha personalidade com ajuda dos erros. Sentia-me livre e preparada para curtir a vida. Não que atualmente me sinta presa ou despreparada, mas o excesso de responsabilidades explica claramente essa diferença.
Não havia necessidade de trabalhar, a única obrigação era o estudo que, ainda assim, permanecia incomparável com os de hoje. O relacionamento com os meninos era diferente: a inocência somada à curiosidade resultava em consideração, um respeito pelo tempo. E assim amávamos, sem muita pressa nem muita disputa! Os criteriosos chamavam de bons momentos, os sonhadores denominavam paixão e os exagerados até hoje estão em dúvida entre a pior e a melhor coisa do mundo... pra mim eram as duas juntas.
O relógio preso na parede do salão adiantava o tempo lentamente, mas na minha mente o ponteiro andava em sentido anti-horário. Eu pensava nas tardes em que tomava banho de chuva, nos encontros do shopping, nas cartas das amigas, noites em claro, televisão ligada. Quanto mais menina me fazia a imaginação, mais o pensamento retrocedia nas épocas.
Foi quando voltei em outros anos. Lembrei da bola rolando ladeira abaixo, fazendo companhia para os pés descalços que brincavam de queimada, pulavam amarelinha e corriam no pique-pega. Pensei no meu pai e nos raros momentos que passávamos juntos pescando, fazendo pizza, acendendo fogueira ou apenas remendando um fio de eletrônicos. Na cabeça havia espaço para todos os momentos: desde o colégio, com merendeira na mão e maria-chiquinha no cabelo, até invenções que eram vendidas por mixaria nas ruas.
Encontrei em mim uma síndrome de Peter Pan. Sintomas que me admitem a enorme vontade de voltar e parar no tempo. Desejo de viver num mundo onde as pessoas bebem água da fonte da juventude.
Uma voz veio de longe, em um tom baixo, quase incompreensível. Era a manicure pronta para receber seu pagamento e atender a próxima cliente. Dei o dinheiro para ela, levantei e me despedi.
Já em casa, olhando aquelas unhas em tons de marca-texto, resolvi me libertar do calendário e me entregar para o mundo. Foram necessárias poucas idéias para que eu descobrisse que o bom da vida é viver, independente da idade, das responsabilidades ou pretensões. Busquei um vidro de acetona, tirei o esmalte verde, substituí pelo branco. E senti que pra mim pouca coisa tinha mudado.
(Dalila Lemos)
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