sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O TRUQUE

Abriu a caixa. Tirou tudo de dentro. Fechou a caixa. Colocou tudo sobre a mesa. Ela estava mesmo disposta a fazer isso novamente! O telefone tocou durante cinco minutos sem que Laura Borges, sequer, ouvisse. Só uma coisa tomava conta do seu pensameto: o truque.Qualquer palavra que falasse, qualquer passo em falso que desse seria o fim.

Os riscos deveriam estar de acordo com as estratégias. Nenhum atraso da pessoa que esperava. A campainha tocou, o médico chegara. Laura o convidou para sentar-se na mesa e acendeu seu primeiro cigarro. Durante um trago e outro ela escutava um barulho: era o telefone, insistia em tocar. Apagou o cigarro no cinzeiro e começou a mexer nos objetos que havia tirado da caixa. O médico fazia o mesmo, porém com bastante habilidade. Não havia dúvidas, ele era eficaz, inteligente, rápido.

Os planos de Laura começaram a dar errado, acendeu outro cigarro e tragou com desespero. Estava prestes a ser derrotada, precisava fugir disso, não havia ninguém que ajudasse.O telefone tocou mais uma vez. Quebrou a segunda regra e atendeu. Um simples suspiro fez com que ela soubesse de quem era a ligação. Acendeu outro cigarro, andou de um lado para o outro, mas não desligou. Precisava fazer e tinha que ser agora.

Devagar e em baixo tom as palavras foram saindo de sua boca. Laura suava, não se continha, as frases começaram a se embaralhar e a voz tornara-se trêmida. Finalmente falou: "Bárbara, Bárbara! Se soubesse o quanto me influenciou... Falava em truques como quem fala do ar que respira. Truques, estratégias, macetes. Coisas que fazem de você uma vencedora. Mas eu... Eu não quero mais deixar de ser quem sou por causa de uma disputa mesquinha. Não quero mais agüentar noites em claro, maços e garrafas vazios. Não quero mais jogar!"

Quebrou a terceira regra e desligou o telefone. O médico, a essa altura, já estava em pé ao lado da mesa e olhava distorcido para os cantos da casa. Laura não falou uma palavra, abriu a caixa, guardou o tabuleiro, as fichas, os pinos e o dado. Olhou pra ele com a expressão confusa de quem queria ficar só. Ele se foi.
Na hora de dormir ela pensava sobre lance de dados, fichas sendo entregues, pinos avançando sobre o tabuleiro. Ninguém ganharia nunca!!! Foi melhor assim. Não havia mais jogo. E o truque era esse.

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