Texto original: http://m.folha.uol.com.br/colunas/gregorioduvivier/2016/09/1812342-desculpe-o-transtorno-preciso-falar-da-clarice.shtml?cmpid=facefolha
Os olhos, sempre arregalados e em tons diferentes de verde, deixavam claro que os amigos dele conseguiam reparar detalhes que eu mal cogitava. Mas eram de passarinho - isso eu sabia bem. E não pense que o Gregório é o diferentão da paixão à primeira vista... Eu também passei por isso (e confesso: acho que foi macumba).
Começamos a re-namorar no dia 27 de Novembro. Ele pensou que fosse dia 20. Conclusão: ta tudo bem na fila de espera do Alzheimer.
Não vimos todas as séries. Longe disso: eu dormi e continuarei dormindo no meio delas. Inclusive, durante as minhas favoritas. E várias vezes. Não me encham o saco. Obrigada, de nada.
Não fizemos receitas de risoto. Fizemos farofa. E a dele é a melhor que eu já experimentei.
Não queimamos nenhuma panela de comida porque meu teflon das Lojas Brasil é coisa linda de se usar. Não escolhemos móveis sem saber se eles passariam na porta, mas, em compensação, tomamos incontáveis cervejas sem saber se caberiam no estômago.
Não fizemos uma dúzia de amigos novos porque nossos amigos são antigos e cheios de mania. Melhor não arriscar! Também nunca fizemos curta - a sociedade não está preparada para o nosso deboche.
Sofremos com os bares fechados, rimos com litrão a sete reais. Não viajamos o mundo, mas descobrimos o significado de "Uhulll" sem sair de casa. Das dez músicas que mais gosto, sete ele se nega a acreditar (e isso inclui "Não Ter", da Sandy e do Júnior). As outras três talvez ele tenha me mostrado, mas eu também não me lembro.
Aprendi o que era feminismo na marra, e não foi com ele. Agradeço! Cisgênero, gaslighting, heteronormativade e mansplaining também. Em contrapartida, graças a ele eu nunca esqueci que a capital de Alagoas é Manaus. Não, péra! Ai meu Deus.
Uma vez terminamos. E não foi fácil. Parecia que pra sempre ele ia fazer falta. Eu estava certa! Se a gente ao menos tivesse tido um filho, pensava, o encosto seria eu.
Essa semana vi a gripe dele passando pra mim - não por acaso uma história de azar. Achei que ia espirrar tudo de novo! E o que me deu foi uma felicidade profunda de poder dividir esses perdigotos. Sabe como é né, eu sou Dalila. Clarices devem ser mais elegantes.