segunda-feira, 14 de setembro de 2009

DICIONÁRIO

Durante o almoço surge uma frase: “o que fulano fez foi sacanagem!”. Meu avô interrompe a conversa, dizendo que essa palavra tem um significado horrendo. Encapelado, ele diz logo em seguida:

- Você sabe o que está dizendo? Sacanagem se resume a um filho que trepa com a mãe. É um palavrão aterrorizante!

Fiquei abestalhada e me senti na obrigação de contestar:

- Nossa, vô! Você, uma pessoa de costumes tão antigos, falando “trepar”!?!

E ele lá, há uns cinco minutos, tentando me persuadir com sua opinião. Quase sem paciência, pronunciei (sem certeza nenhuma) que a palavra sacanagem possui vários significados. Abracei uma das decisões mais sérias de toda minha vida:

- Preciso só de um minuto para pegar o dicionário.

Sem sombra de dúvida, procurei os significados longe dele. Se estivesse errada quanto à inocência do que eu quis dizer no início da conversa, posteriormente, daria um jeito de enrolar o velhinho só pra não pagar o prejuízo. Mas tudo ocorreu conforme eu já imaginava:

- Pronto. Vim esclarecer nossa dúvida! Aquela palavrinha mágica possui três significados diferentes: 1. Ação, dito ou procedimento de sacana. 2. Bandalheira, imoralidade, safadeza, patifaria. 3. Brincadeira de mau gosto, troça. O terceiro significado é o que se encaixa melhor na minha frase.

Logo após, meu avô balbuciou algumas letras perdidas e contentou-se com o meu argumento. Algo que antes me incomodava, agora já não me incomoda mais. Posso falar “sacanagem” quantas vezes eu quiser. Vejam bem:

- Sacanagem! Sacanagem! Sacanagem!

Se ele resmungar ou esquecer de tudo, eu pego o dicionário e resolvo a confusão em um minuto.
Esse texto podia acabar assim se não houvesse a enorme necessidade de apresentar outras palavras e seus supostos significados.

“Horrendo” significa o mesmo que “aterrorizante”. Você pode substituir “encapelado” por “furioso” e entender que meu avô ficou realmente fora de si. Sentir-me “abestalhada” é tão ruim quanto ficar “abobada”, pois essas duas uniões de letras me lembram apelidos escondidos na infância. “Patifaria” até que soa agradável, mas é nada mais nem menos que “pouca-vergonha”.

Enfim. Graças a deus meu coração tem dono, pois se o Rodrigo Hilbert aparecesse na minha frente, eu não precisaria de dicionário pra entender o significado número dois da palavrinha mágica. E já que estamos falando em dois... o pensamento seria pequeno se não coubesse o Rodrigo Santoro nessa imoralidade toda. Aí sim, surgiria um novo assunto: “êxtase” (ou “fascínio”, segundo os sinônimos do Microsoft Word).

Quer saber de uma coisa? Eu acho esse lance de dar nome às coisas e coisas aos nomes uma verdadeira SACANAGEM!

(Dalila Lemos)